
Os lírios
Uma das muitas coisas que minha esposa me ensinou foi apreciar flores. Ela gosta muito delas, e sempre que viajamos de férias, tira fotos das que acha mais belas, e eu, apaixonado por fotos que sou, rapidamente também adotei este hábito.
Uma dessas flores que ganhou destaque no novo testamento são os lírios. Jesus, no sermão da montanha, as menciona, elogiando-as ao ponto de afirmar que nem mesmo Salomão, em todo o seu esplendor, podia ser comparável a elas com sua aparência.
Ele descreveu a sua beleza para introduzir um conceito que, hoje em dia, é deixado de lado por causa do culto ao esforço e à recompensa por meio dele. Todos os dias, ouvimos muitas expressões que nos dão a ideia de que, para termos as coisas e conquistarmos o que desejamos, precisamos "fazer por onde", e assim, nos acostumamos a ouvir expressões como: "ele fez por merecer" ou "ela ou ele merece". Há até mesmo pessoas que mencionam um ditado que diz: "Esforça-te, e eu te ajudarei". Elas, inclusive, alegam que este dito é bíblico. Contudo, ele não existe na Bíblia, sendo uma adaptação de uma passagem que consta no livro de Josué:
Não fui eu que ordenei a você? Seja forte e corajoso! Não se apavore nem desanime, pois o Senhor, o seu Deus, estará com você por onde você andar. (Js 1: 9)
Apesar do esforço ser um conceito valorizado por Deus, não podemos afirmar que ele é a fonte do êxito humano, e que, numa relação de causa e consequência direta, se não nos esforçarmos, não obteremos êxito nem alcançaremos as realizações da vida. O mal que há nisso é que, ao nos prendermos a este princípio, perdemos de vista o que é bíblico e real, que é o fato de que Deus cuida de nós em todas as dimensões e níveis possíveis, de uma forma inexplicável, intangível e imerecida, tal como é explícito na passagem do evangelho de Lucas, abaixo:
Dirigindo-se aos seus discípulos, Jesus acrescentou: "Portanto eu digo a vocês: Não se preocupem com sua própria vida, quanto ao que comer; nem com seu próprio corpo, quanto ao que vestir. A vida é mais importante do que a comida, e o corpo, mais do que as roupas. Observem os corvos: não semeiam nem colhem, não têm armazéns nem celeiros; contudo, Deus os alimenta. E vocês têm muito mais valor do que as aves! Quem de vocês, por mais que se preocupe, pode acrescentar uma hora que seja à sua vida? Visto que vocês não podem sequer fazer uma coisa tão pequena, por que se preocupar com o restante? "Observem como crescem os lírios. Eles não trabalham nem tecem. Contudo, eu digo a vocês que nem Salomão, em todo o seu esplendor, vestiu-se como um deles. Se Deus veste assim a erva do campo, que hoje existe e amanhã é lançada ao fogo, quanto mais vestirá vocês, homens de pequena fé! Não busquem ansiosamente o que comer ou beber; não se preocupem com isso. Pois o mundo pagão é que corre atrás dessas coisas; mas o Pai sabe que vocês precisam delas. Busquem, pois, o Reino de Deus, e essas coisas serão acrescentadas a vocês. "Não tenham medo, pequeno rebanho, pois foi do agrado do Pai dar o Reino a vocês. Vendam o que têm e deem esmolas. Façam para vocês bolsas que não se gastem com o tempo, um tesouro nos céus que não se acabe, onde ladrão algum chega perto e nenhuma traça destrói. Pois, onde estiver o seu tesouro, ali também estará o seu coração. (Lc 12: 22-34)
Contudo, esta passagem não se limita a nos dizer que Deus cuida de nós, homens de pequena fé, mas descreve também como Deus faz isso. Ele o faz de uma forma sublime e inexplicável. Contrariando a lei do retorno, os corvos, por exemplo, dependem e descansam na providência divina. Eles não se esforçam para plantar os grãos que os alimentam; antes, Deus os dá. O mesmo acontece conosco.
Olhando para o passado, em quantas circunstâncias já nos encontramos, ou a quantos estímulos já fomos submetidos, dos quais usufruímos benefícios e que atuaram na construção do que somos hoje, aos quais não fomos expostos intencionalmente ou por nossa própria vontade? Acredite: isto nunca ocorreu por acaso; antes, é fruto da providência divina atuando nas nossas vidas. Sim, Deus nos protege, nos abençoa e nos alimenta, gratuitamente, muito mais do que os corvos!
Como se não bastassem todas essas garantias, Jesus vai além, e faz promessas quanto ao futuro: "Não tenham medo, pequeno rebanho, pois foi do agrado do Pai dar o Reino a vocês". Ou seja, esta passagem não dá garantias apenas em relação à nossa vida terrena. Ela foi dita pelo Filho de Deus para assegurar a nós, filhos adotivos em Cristo, que toda a sua existência está segura, no passado, presente e por toda a eternidade, e Jesus pode prometer isso porque Ele mesmo é o autor de nosso resgate, e pagou um alto preço para neutralizar as consequências dos pecados que mantêm o ser humano longe de Deus. Ou seja, a obra de Deus é completa, e abrange as nossas necessidades presentes, como o alimento, a água e o ar, assim as do futuro, quando desfrutaremos da presença ilimitada de Deus em nossas vidas, sem barreiras e nem pecados, e não sentiremos mais fome, nem dor, nem sofrimentos.
Pela suficiência destas promessas, Jesus manda que foquemos nossa atenção em algo muito maior do que nas nossas ansiedades, e declara isto porque ensina que nós somos cuidados por Ele. Por mais que a ansiedade seja uma característica humana, ela reflete a nossa natureza decaída, que tem o desejo de vivermos separados de Deus, longe de seus cuidados. Ela é uma recusa de descansar na providência divina. Em outras palavras, ao sermos ansiosos, depositamos em nossos próprios recursos o mérito da sobrevivência, e negamos, com atos, que nossa vida inteira depende de Deus, em todas as instâncias. Ao sermos ansiosos, colocamos o esforço humano em primeiro lugar, e Deus em último, e assim pecamos contra Deus.
Oro a Deus para que trabalhe em nossos corações para que, a cada dia mais, tenhamos sabedoria suficiente para depositarmos em Deus as nossas preocupações e anseios, e que descansemos na certeza de que Ele sempre cuidou e é poderoso para suprir todas as nossas necessidades, no presente e por toda a eternidade!